Combustíveis puxam série de aumentos
A alta no preço dos combustíveis vai além dos gastos para encher o tanque. Nas últimas semanas, desde o último anúncio de reajuste feito pela Petrobras – de 18,8% na gasolina e 24,9% no diesel -, vários aumentos foram anunciados.
As tarifas de viagens por aplicativos subiram até 6%; as entregas por delivery, até 50%; e as passagens aéreas, entre 32% (internacionais) e 62% (nacionais). Isso sem contar o que vem pela frente. As empresas de transporte público reivindicam aumentos de cerca de 20%.
Alimentos e produtos industrializados também sentem os efeitos da alta dos combustíveis, por causa do aumento dos fretes. Hoje, o Brasil movimenta mais de 60% de suas cargas por rodovias, em caminhões movidos a diesel.
Como o reajuste impacta o custo das transportadoras, esse aumento também é repassado para o frete. Algumas já conseguiram recompor as perdas, outras ainda estão renegociando os contratos com os clientes para repassar, pelo menos, parte do aumento.
O presidente do Sindicato das Empresas de Transportes de Carga de São Paulo e Região (Setcesp), Adriano Depentor, afirma que a entidade aconselhou seus associados a reajustarem o frete entre 14% e 15%. “A orientação é repassar os aumentos para manter as contas saudáveis. Mas cada um vai decidir o porcentual e a melhor forma de revisar seus preços”, diz o executivo, destacando que as companhias têm contratos de longo prazo com clientes.
Em 12 meses, diz, o valor do frete por quilômetro subiu entre 20% e 28% por causa da inflação e da mão de obra. “Quem viveu os tempos da hiperinflação tem até arrepio de ver a escalada dos preços.” Em março, o IPCA subiu 1,62%, maior alta para o mês em 28 anos.
Gasto cresceu R$ 1,25 bi
Entre os meses de março e abril, o gasto dos brasileiros com despesas essenciais, como combustíveis, alimentos e educação, aumentou R$ 16 bilhões. Desse total, R$ 1,25 bilhão veio do reajuste da gasolina e diesel, segundo dados da consultoria Tendências Consultoria Integrada. Isso explica o avanço de 1,62% da inflação em março, a maior para o mês em 28 anos.
A expectativa é que os preços continuem a pressionar a renda dos consumidores, que vem sendo corroída ano após ano. A economista da Tendências, Alessandra Ribeiro, afirma que, como se trata de um bem com pequena elasticidade, o aumento reduz o espaço no orçamento do brasileiro para outros bens e serviços. “E isso tem um efeito redutor no crescimento econômico.”
Impactos da alta no combustível
Para o presidente da Trevisan Escola de Negócios, VanDyck Silveira, a alta dos combustíveis provoca uma bola de neve na economia por causa dos repasses. Além do preço do frete, que é transferido para outros produtos, o setor de serviços também reflete o aumento. As viagens de carro por aplicativos, por exemplo, ficaram mais salgadas desde o anúncio da Petrobras.
O presidente da Associação de Motoristas de Aplicativos, Eduardo Lima de Souza, afirma que a tarifa da 99 subiu 5% e a do Uber, 6,5% por km rodado. “O aumento dos combustíveis foi de 18%, então continuamos com defasagem. Muitos motoristas estão tendo de ampliar a carga horária para manter a renda.” Isso significa trabalhar até 14 horas por dia.
Nesse caso, o consumidor não tem para onde correr. O preço das corridas de táxis também subiu. Em São Paulo, depois de sete anos sem aumento, a prefeitura autorizou o reajuste. O valor inicial da corrida saltou para R$ 5,50, com aumento de 22%. O quilômetro percorrido teve alta de 45%. A tarifa horária, cobrada quando o carro está parado ou em baixa velocidade, subiu 48%, para R$ 49.
“O aumento tinha de sair de qualquer jeito, a categoria estava numa situação delicadíssima”, afirma Luiz Capelo, vice-diretor do Sindicato dos Taxistas Autônomos de São Paulo. Ele conta que, antes do reajuste, muitos motoristas enfrentavam “pane seca”: paravam de rodar por falta de dinheiro para abastecer.
A maioria roda com carros movidos a etanol e gás natural veicular (GNV). Só uma pequena parcela abastece com gasolina. Dados da Agência Nacional do Petróleo mostram que, nos últimos três meses, o preço médio do GNV subiu 25,86%, a gasolina comum teve alta de 10,93% e o etanol, de 4,15%.
Entregas
Outro hábito que caiu nas graças do brasileiro, o delivery também teve suas taxas revisadas pelas empresas. Desde o início do mês, os entregadores do iFood tiveram aumento de 50% no valor mínimo por km rodado, de R$ 1 para R$ 1,50, e outro de 13% no valor da rota mínima (a menor quantia que recebem por uma entrega), de R$ 5,31 para R$ 6.
Segundo a companhia, o aumento teve caráter de urgência por causa da inflação e do aumento dos combustíveis.
No transporte escolar, o reajuste médio das mensalidades, que ficou em torno de 20%, fez com que 30% dos pais desistissem do serviço, conta Anderson Malafaia, presidente da União Geral do Transporte Escolar.
A entidade tem 3 mil associados no Estado de São Paulo, entre motoristas autônomos, empresas e cooperativas.
Quase a totalidade dos veículos usados no transporte escolar são movidos a diesel. “O impacto da alta do diesel foi muito relevante para nós e o nosso custo operacional subiu demais”, diz Malafaia.
Mesmo com aumento da mensalidade do transporte escolar, que varia muito a depender do bairro, entre R$ 200 e R$ 900, por exemplo, Malafaia diz que esse reajuste não cobre todos os aumentos de custos que os motoristas tiveram. A necessidade de reajuste da mensalidade para retornar à situação pré-pandemia seria em torno de 40%.
Outro que reivindica uma revisão dos preços é o setor de transporte público, em que o diesel representa 30% da operação (antes do aumento da Petrobras era de 26,6%).
Segundo o presidente executivo da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos, Francisco Christovan, com a alta do diesel o setor teria de reajustar tarifas em 19,5%, mas nada foi repassado.
Nos bares e restaurantes, por causa da pressão de alimentos e, sobretudo, gás de botijão – que aumentou quase 30% em 12 meses -, a situação é crítica. “O gás representa entre 8% e 10% do custo das nossas mercadorias”, afirma Paulo Solmucci, presidente da Abrasel.
Pesquisa recente da entidade revela que 38% dos estabelecimentos amargam prejuízos e 60% declararam estar no vermelho porque não conseguiram repassar aumentos de custos para o cardápio.
*As informações são do jornal O Estado de S. Paulo e Estadão Conteúdo.